Traços - Novel - Capítulo 21

Após o almoço, Jiheon foi para o quarto de Jaekyoung. Ele ficou em frente à porta, e bateu com cautela. Da cozinha, onde a Sra. Shim estava fazendo café, ela gritou:

— Ele não vai responder mesmo que você chame. Abra a porta e entre, Jiheon.

Seguindo seu conselho, Jiheon abriu a porta com coragem. Deitado na cama e usando fones de ouvido, Jaekyoung perguntou: — O que foi?

— Tem planos para o dia de hoje?

Tirando os fones de ouvido, Jaekyoung perguntou:

— O quê?

— Você tem planos para mais tarde?

— Por quê?

— Vou me encontrar com o presidente do patrocinador. Se estiver livre, quer vir comigo?

— Sobre o que é a reunião?

— Apenas… uma breve apresentação. Iremos dizer a ele que estamos cuidando do seu trabalho e de que terá um bom desempenho, por isso, por favor, continue dando apoio…

— Eu não vou.

Jaekyoung recusou sem pensar muito na proposta de Jiheon.

— Por que não? Por que você não quer ir?

— Se eu for, ele provavelmente vai começar a falar sobre as Olimpíadas. Por que se preocupar com isso?

A resposta de Jaekyoung continha um tom de irritação.

— E duvido que aquele velho também queira me ver. Há alguns anos, estive brevemente na Coreia para as provas olímpicas e ele ficou me ligando várias vezes, então eu disse algo a ele.

— O que você disse…?

— Eu disse a ele que já não tinha tempo para treinar e que suas ligações estavam se tornando um incômodo.

‘…ele está falando sério?’

Jiheon ponderou. Não importava o quanto ele fosse sincero, era difícil acreditar que Jaekyoung se comportaria dessa forma com alguém que havia pago a ele.

Se ele estivesse simplesmente alternando entre agir de forma agressiva com os fracos e de forma agressiva com os fortes, Jiheon teria dito a ele para corrigir essa atitude de alguma forma. Mas se esse era o comportamento habitual de Jaekyoung, Jiheon precisava reconhecer isso agora.

Jaekyoung de fato nasceu assim. Nesse ritmo, Jiheon achava que poderia haver um problema com o cérebro do lado direito de Jaekyoung relacionado à avaliação de situações e à compreensão do contexto. Mesmo que os neurônios estivessem intactos, poderia haver uma falha nas sinapses.

(N?T: Sinapses neurais são as conexões especializadas entre neurônios onde ocorre a transmissão de informações.)

— Certo… o presidente vai ficar surpreso se você decidir vir.

Jiheon assentiu, dizendo para Jaekyoung que cuidaria do assunto sozinho.

Mas pouco antes de fechar a porta, Jaekyoung perguntou:

— Você só vai se encontrar com o patrocinador?

— Não. Também tenho que visitar o escritório da federação.

— Por que a federação?

— Eu também devo dar os cumprimentos a eles.

Os olhos de Jaekyoung se estreitaram em silêncio. Ele parecia insatisfeito com alguma coisa.

Jiheon decidiu não aprofundar no assunto. Ele não queria investigar mais sobre a insatisfação de Jaekyoung. Era mais eficiente descobrir o que Jaekyoung gostava no mundo abordando a situação por esse ângulo.

— Descanse um pouco.

Em seguida, Jiheon saiu do quarto.

— Jaekyoung vai com você?

Sra. Shim perguntou, entregando uma xícara de café a ele.

— Não, senhora.

— Já sabia. É claro que ele não vai.

A Sra. Shim balançou a cabeça, como se suas expectativas nunca tivessem sido altas para começar.

Jiheon explicou:

— Ele disse que estava muito cansado e decidiu pular o treinamento da tarde. Em dias como esse, normalmente é melhor descansar e evitar muito esforço.

Quando Jiheon terminou de falar, a porta do quarto se abriu e Jaekyoung apareceu, usando um boné de beisebol.

— Preciso encontrar um amigo, como estamos indo para a mesma direção, pode me dar uma carona.

— Onde você pretende encontrar seu amigo?

— Itaewon.

Por coincidência, o escritório da federação estava localizado em Yongsan, que por acaso ficava no caminho.

— Mas eu tenho que passar na casa do Diretor Cho primeiro. Fiquei de me encontrar com ele às duas horas.

Jiheon checou a hora em seu celular enquanto falava.

— Talvez seja necessário que você espere no carro enquanto eu vejo o diretor. Tudo bem? Será apenas uma breve apresentação, não deve demorar muito.

— Não me importo.

— Ok, então vamos.

Jiheon tomou um gole de seu café e depois colocou a xícara na mesa.

◆◇◆

Ao chegar ao estacionamento, Jiheon pediu para Jaekyoung esperar um pouco enquanto ele arrumava o banco de trás do carro. Depois de reorganizar as bolsas e itens espalhados para dar espaço para ele, Jiheon se acomodou no banco do motorista.

— Entre.

Mas Jaekyoung abriu a porta do banco do passageiro e colocou o cinto de segurança.

— Senta no banco de trás. Eu limpei tudo para você.

— Não. Não estou em um táxi.

‘Ei, você está tentando insinuar que não sou seu chofer particular? Ou está apenas dizendo que não se sente confortável sentado no banco de trás porque eu estou dirigindo, certo?’

Com qualquer outro atleta, Jiheon teria facilmente interpretado dessa forma, mas como se tratava de Jaekyoung, ele levou um momento para entender o significado.

— Pense nisso como se fosse um táxi. Parte do meu trabalho é levar você de um lado para o outro. Toda vez que você viajar de acordo com sua agenda, o carro será dirigido por mim ou por alguém da empresa. Então, não há necessidade de você sempre sentar no banco do passageiro.

— Eu cuido disso depois.

Jaekyoung interrompeu a explicação de Jiheon e se acomodou no banco do passageiro. Os assentos da frente foram ocupados em pouco tempo. O carro era um sedã relativamente grande, com bastante espaço nos assentos dianteiros, mas quando dois homens grandes sentaram lado a lado, uma estranha sensação de sufocamento se instalou. Jiheon prontamente abaixou a janela.

— Vou abrir a janela um pouco. O ar-condicionado está com um cheiro muito forte.

Ele explicou, ligando o ar-condicionado tardiamente. Jaekyoung não respondeu, apenas ficou olhando para frente, com o braço apoiado no parapeito da janela. Observando sua expressão, parecia que ele não achava nada de estranho na situação.

Isto era certo. Jiheon havia, de fato, colocado o chip adequadamente e havia verificado várias vezes para garantir que estava funcionando corretamente. No entanto, se houvesse uma quantidade suficiente de feromônios sendo liberados para que Jaekyoung percebesse, Jiheon teria considerado processar o fabricante do chip.

Ele sabia disso, mas não conseguia se livrar de seu desconforto.

‘Devo aumentar a dosagem do medicamento?’

Enquanto Jiheon conduzia o carro para a estrada, ele refletiu. A dosagem atual que ele estava usando já era um pouco excessiva, mas, por alguma razão, ele não estava nem um pouco aliviado. Sua preocupação havia aumentado, especialmente depois de ouvir algumas coisas do Doutor Lim.

Enquanto revisava mentalmente sua agenda e calculava quando poderia visitar o hospital, Jaekyoung subitamente quebrou o silêncio.

— Hyung, esse carro é seu?

— Eu nunca comprei um carro, principalmente um tão grande.

Jiheon respondeu, fazendo uma curva acentuada com o volante, e continuou:

— É o carro da empresa.

— Quando você tirou sua carteira de motorista?

— Na época em que eu estava na faculdade.

— Em que ano?

— Bem, acho que não foi durante meu primeiro ano. Talvez no segundo ano?

— Você nunca comprou um carro?

— Não. Na faculdade, usei o carro do meu pai por um tempo, mas depois que entrei na empresa, geralmente ando a pé ou de ônibus porque é perto.

Jiheon respondeu às perguntas de Jaekyoung, mas não pôde deixar de se perguntar por que Jaekyoung estava tão curioso.

‘Ele está perguntando porque está preocupado com a minha experiência ao volante?’

Esse pensamento deixou Jiheon desnecessariamente nervoso, fazendo com que ele apertasse o volante com mais força.

Ao sair do estacionamento do hotel, Jiheon procurou fazer curvas mais suaves do que o normal. Ele entrou na estrada com segurança e relaxou por um momento quando o sinal fechou. Entretanto, a voz de Jaekyoung quebrou o silêncio mais uma vez.

— Você já foi buscar seu namorado?

— O quê?

Jiheon se perguntou se tinha ouvido direito, então perguntou novamente. Embora Jiheon esperasse que Jaekyoung ficasse irritado por ter de repetir duas vezes, ele simplesmente repetiu a pergunta, sem falar mais nada.

— Você já buscou seu namorado de carro na faculdade?

Jiheon olhou para a expressão de Jaekyoung. O boné de beisebol estava tão baixo que apenas a metade inferior de seu rosto estava visível. Seu queixo estava apoiado nas costas da mão, revelando apenas metade de seus belos lábios.

— Sim, é claro.

Jiheon voltou seu olhar para a estrada e respondeu de forma sucinta.

— Você namorou mais mulheres ou homens?

— Com base na lógica, você acha que seriam mais homens ou mulheres?

Jiheon sorriu. Jaekyoung ainda estava com o queixo apoiado na mão e disse:

— Não sei. Porque você é o tipo de pessoa que agrada tanto a homens quanto a mulheres, hyung.

— O que está dizendo? Mesmo se disser isso, você não vai ganhar nada.

Jiheon exagerou em sua resposta, envergonhado. As avaliações de Jaekyoung eram bastante gentis, mas Jiheon ficou ainda mais surpreso com o fato de Jaekyoung parecer imparcial.

Ele pensou que Jaekyoung poderia presumir que os parceiros de Jiheon seriam todos homens, considerando que ele era um ômega. No entanto, Jaekyoung estava perguntando sobre homens e mulheres.

Era estranho e um pouco surpreendente que Jaekyoung, que geralmente é visto como um alfa, ao mesmo tempo não se restringisse aos preconceitos. Na verdade, ele estava quebrando o estereótipo de que os homens alfa só namorariam homens ômega ou mulheres alfa. Na realidade, Jaekyoung só namorou homens beta.

— Na faculdade, a presença de estudantes mulheres correspondia a apenas um quarto da dos homens. Estatisticamente, esse era o caso, mas na realidade parece ser ainda menor, talvez perto de um quinto. No meu departamento a maioria dos estudantes eram homens. Essa explicação é suficiente?

— Qual era o seu curso?

Jaekyoung perguntou imediatamente.

— Departamento de Marketing Esportivo.

— Por que você escolheu essa área?

— Eu estava procurando um bom curso com base em minhas notas e conquistas, então achei que era a escolha certa?

— Independentemente do seu potencial?

— Potencial, não é?

Jiheon murmurou a palavra como se a tivesse ouvido pela primeira vez.

— Não me lembro de ter pensado muito nisso. Quando considerei os desejos dos meus pais, senti que deveria frequentar uma universidade de prestígio por quatro anos, e o Departamento de Marketing Esportivo da minha faculdade parecia promissor.

— Como se sente em relação ao seu trabalho?

— Você acha que isso se encaixa com meu potencial?

Jaekyoung acenou silenciosamente com a cabeça.

— Quem sabe… acreditava que era mais uma questão de combinar as coisas. Quantas pessoas realmente conseguem passar a vida fazendo apenas o que querem? Contanto que não seja algo intolerável, posso viver moderadamente.

Ao se aproximar de um cruzamento, um carro próximo fez sinal para entrar e gradualmente começou a mudar de faixa. Jiheon diminuiu um pouco a velocidade e disse:

— Eu fazia parte da equipe de relações públicas até a semana passada. Meu papel principal era escrever artigos para a imprensa e, às vezes, participava do planejamento de marketing ou ajudava na criação de conteúdo. Se você analisar a função, vai ver que é mais parecido com planejamento de publicidade do que com marketing esportivo. Mas valeu a pena.

— Então, esta é sua primeira vez acompanhando um atleta?

— Em termos administrativos, você quer dizer? Sim, é a minha primeira vez.

— Você acha que essa posição é adequada para seu potencial?

— Ainda não tenho certeza absoluta. Hoje é o meu primeiro dia.

Jiheon deu um leve toque no assunto, quase como uma piada. Naquele momento, Jaekyoung virou a cabeça e olhou para ele pela primeira vez. Ele apoiou o queixo nas costas da mão e observou Jiheon dirigindo, antes de fazer outra pergunta.

— Se esta é sua primeira vez gerenciando, como você lidou com aquele atleta?

— Aquele atleta?

Jiheon não tinha ideia de quem ele estava se referindo.

— De quem você está falando?

— Aquele no elevador?

— Ah, Yeonho.

Simultaneamente, quando Jiheon murmurou o nome, o sinal do semáforo abriu.

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LILITH TRADUZ (@lilithtraduz)